TRANSMONTAR

Dissertações sobre Trás-os-Montes, seu passado, presente e futuro. Idiossincrasia transmontana e visão do mundo a partir deste torrão.

28 janeiro 2004

Miklos Fehér

Miklos Fehér (1979 - 2004)

A sua existência terrena foi ceifada antes que pudesse provar, integralmente, o triunfo do bem sobre o mal, que, no fundo, simplisticamente, é ao que se reconduz a “guerra” quotidiana de superação de obstáculos, limitações próprias, injustiças e desonestidades sofridas, por parte de quem pretende manter uma recta conduta ética e moral.
Mas “Miki” já antes tinha sido “ceifado” (gíria futebolística), vitimado por um cocktail explosivo de desavenças familiares, rivalidades várias, com interesses económicos pelo meio, num jogo de marionetas donde estava arredado o respeito devido a um ser humano e aos seus mais elementares direitos cívicos e profissionais. Ninguém saberá avaliar, em toda a sua extensão, os prejuízos irremediáveis que uma “quarentena” forçada lhe terá infligido. A tudo isto soube sobreviver e responder com a tocante e serena verticalidade de um carácter íntegro e determinado.
Talvez seja esta a chave para a compreensão do fenómeno de compaixão que o seu desaparecimento gerou na sociedade portuguesa, muito para além da tribo desportiva de raças e credo vários. O seu profissionalismo tão exaltado e reconhecido, mas também a sua luta silenciosa e solitária e perseverante, reveladora de uma sólida confiança nas suas capacidades e de uma consciência clara dos objectivos a prosseguir sem quebrantos, são uma lição que não podemos deixar perder, sob pena de o desonrarmos.
Sob a capa de manifestações formais e colectivas de pesar, certos responsáveis vão deixando transparecer, pelo contraste, a vergonha e o remorso que os assola, em mais uma manifestação de patente cobardia, em outras ocasiões disfarçada por berrarias tonitruantes. Permitem, agora, que se veja, por mais que se refugiem no silêncio e na penumbra protectores, a sua má índole, a pedra que têm no lugar do coração, a impossibilidade de assumir a culpa e a humildade exaltante de pedir perdão, nem que seja a título póstumo. Tombarão, um dia, sem honra e com eles a legião de cegos seguidores que não souberem – acredito que não saberão – aprender a sábia lição do malogrado Miklos Fehér.