TRANSMONTAR

Dissertações sobre Trás-os-Montes, seu passado, presente e futuro. Idiossincrasia transmontana e visão do mundo a partir deste torrão.

31 agosto 2003

Aperfeicoamento da democracia

Aperfeiçoamento da democracia

Do Outro, eu extraio esta proposição:
"A ideia de pôr em causa o sufrágio universal é o maior retrocesso que consigo imaginar na ideia de democracia. Não é necessário citar a frase de Churchill que se tornou cliché para entender que todas as alternativas são aterradoras. O tema foi lançado no cristovao-de-moura a reboque do reaccionarismo (a expressão não é minha) do avô Joaquim de PVG e já teve os contributos do Carimbo e do Alfacinha. PVG, que iniciou a conversa, acha-a "uma grande chatice". Eu digo: uma grande chatice seria o regresso à ideia de despotismo esclarecido que PVG propõe. A democracia já tem as suas perversões naturais suficientes para tornar desnecessário que, em nome do seu aperfeiçoamento, a pervertamos sem remédio. Já agora, quem seria o juiz da capacidade de votar?"
A causa dos aperfeiçoamentos projectados para a democracia, a que alude, criticamente, o Outro, eu, radica nas "(...) perversões naturais" que se toleram, irresponsável, displicente e complacentemente em democracia.
Os problemas que venho abordando, da morte anunciada do mundo rural e a resposta desadequada do poder autárquico, que se propagam por dois terços do país como doença contagiosa do sistema democrático, alimentada, parasitaria e insidiosamente, dos magros recursos nacionais e comunitários, iludidos e generosos, comentam-se em surdina como se se tratasse da fatalidade de uma maldição a que não se pode escapar.
Nem a ameaça, latente, de colapso que impende sobre a parte saudável que resta provoca qualquer debate com carácter de urgência. Ninguém está disponível para afrontar este cancro predador furtivo; nem mesmo este território livre da blogosfera dá sinais de estar interessado em constituir-se fórum de pressão esclarecido, apesar das cintilantes e influentes estrelas do firmamento mediático e político que o habitam. E assim segue, impotente, a democracia, manietada pelas suas contradições, das quais as institucionais são as mais paralisantes. Compreendo muito bem o desespero de quem, tendo razão, provada à saciedade pela realidade, tem de vencer a dura e ingrata prova do convencimento maioritário, sempre sensível à manipulação dos cantares de sereia demagógicos numa colossal encenação de ineficácia, rodeando os mesmos problemas em circular movimento perpétuo. E são, normalmente, os mais encarniçados adeptos incondicionais da democracia os que se queixam da ineficiência da acção política e da sua incapacidade de solucionar os problemas recorrentes da sociedade e não tanto aqueles, apodados de inimigos deste popular e, ainda assim, virtuoso regime, que já lhe anteciparam os limites e se retratam no cepticismo das suas convicções.
Viva a democracia como proposta adequada à gestão da soberania, delegada por um povo maior e esclarecido!